Alguns pontos importantes para manter uma prática:
- Praticar diariamente, mesmo que seja por um curto espaço de tempo.
O poeta Rumi perguntava: “fazes visitas regulares a ti mesmo?”
Um hábito cria-se pela repetição. E se queremos criar novos hábitos, novos caminhos na nossa mente-coração, é importante manter uma prática regular, mesmo que sejam só cinco ou dez minutos por dia. E em vez de deixar que as nossas disposições e “apetites” controlem a nossa prática, ajuda preestabelecer um tempo e espaço para a meditação formal no nosso dia-a-dia. E “just do it”.
- Uma questão de atitude
Uma das razões que leva muitas pessoas a deixar de meditar são os julgamentos sobre como praticam e sobre a própria experiência. Praticamos “prestar atenção”, mas esta atenção não é algo apenas cognitivo, ou simplesmente concentração. O que é transformador é a atitude, as qualidades que trazemos e cultivamos com a prática.
É importante tomar consciência da frustração, da autocrítica, do “devia” ou “tenho de” e como isso se pode sentir como uma contração e um fechamento. Em vez de mais uma tarefa no nosso dia-a-dia já bastante ocupado, lembrar que escolhemos cultivar mindfulness porque nos importamos em viver mais perto do nosso coração. No início de cada sessão de prática, lembre por que é importante para si meditar. E depois estabeleça a intenção de aceitar e trazer gentileza para o processo, para seja o que for que surja. Aceitação e gentileza são as qualidades primeiras para estabelecer uma prática de meditação – permitindo cultivar uma relação de amizade com a prática e com nós mesmos.
Procuramos aceitar a experiência de meditação tal como ela é, tal como ela surge. E da mesma maneira que um cultivador lança a semente no campo, lhe dá as condições para que se desenvolva e o tempo necessário para que cresça, sem esperar que amadureça mais depressa do que o que é natural, não podemos também criar expetativas em demasia.
Esta amizade também implica a curiosidade, o interesse e até o sentido de humor em relação a tudo o que surja – seja isso agradável ou desagradável.
- Qual é a minha prática?
A professora e psicóloga Shauna Shapiro lembra que aquilo a que damos atenção torna-se mais forte. Por isso podemos reforçar a consciência da nossa atitude, lembrando qual é o nosso treino. Se queremos praticar frustração, autocrítica, etc., ou se queremos reforçar e fazer crescer paciência, aceitação, leveza, liberdade. Qual é a minha prática? – é uma pergunta essencial.
- Começar pela atenção à postura
É possível meditar em qualquer posição: sentados, deitados, em pé, em andamento. E a prática começa pelo corpo, pois corpo e mente não são coisas separadas.
Para sentar, pode escolher uma cadeira, um tapete, uma almofada ou um banco de meditação. De preferência de costas direitas, alerta, desperta/o, relaxada/o. As mãos repousam confortavelmente nas pernas, nos joelhos ou no regaço. Os olhos podem estar fechados ou entreabertos, o olhar relaxado. E durante a prática, verifique e ajuste a postura se necessário. É uma forma de estabilizar e voltar ao presente através dos nossos sentidos, sobretudo se damos por nós distraídas/os. É também importante notar os nossos hábitos de contração, frequentemente nos ombros e nos maxilares, e ao notar essa tensão, afrouxar, soltar.
Através da consciência da postura, entramos no caminho da prática. E a meditação não é apenas manter o corpo numa posição correta e conservar a mente calma quando sentados, a meditação é prolongar o estado de uma mente tranquila nessa e noutras situações e transparece na atenção e na consciência com que vivemos sob as mais diferentes condições.
- Aterrar no corpo
Ao tomar consciência do corpo e das sensações, saímos da nossa cabeça e estamos com a nossa experiência. Podemos conetar com a vitalidade, a abertura e o relaxamento da nossa presença.
E começar com um sorriso. Um leve sorriso envia uma mensagem de conforto e à-vontade a todo o sistema. Ao sorrir, dizemos ao nosso corpo que está tudo bem. E podemos depois fazer uma breve rastreio pelo corpo, uma breve exploração, suavizando pontos de tensão, relaxando. E ao relaxar, tomar consciência das sensações, da energia que se move através do corpo.
- Escolher uma âncora
Uma âncora permite ter um lugar onde voltar, é uma base de estabilidade onde se pode apoiar quando nota que se distraiu ou se perdeu em pensamentos.
Algumas das âncoras que pode usar:
- A respiração. Pode pousar a atenção nas sensações da passagem do ar pelas narinas, ou o subir e descer da barriga ao respirar, ou as sensações de expansão e contração no peito. Para alguns, pode ser útil estar com a experiência de todo o corpo a respirar.
- O corpo. Pode pousar a atenção numa parte específica do corpo, por exemplo, as mãos, os pés, a barriga ou o peito,o contacto com o assento. Pode combinar a atenção ao corpo com a respiração. E em momentos de maior distração ou agitação, pode notar pontos do corpo que habitualmente não nota – as sensações e o movimento das clavículas com a respiração, ou a sensações nas costas ou na zona intercostal.
- Sons – Simplesmente escutar os sons conforme surgem e passam, tentando estar o mais possível com a experiência direta dos sons enquanto sons.
- O treino é voltar
Embora procuremos com a meditação acalmar a mente, prevalece frequentemente o mal-entendido de que o objetivo da meditação é libertar-se dos pensamentos, “esvaziar a mente”. O mestre tibetano Mingyur Rinpoche lembra que a essência da meditação é consciência. Não se trata de tentar deixar de pensar, de bloquear pensamentos, pois isso é inglório! E em vez de se criticar por se distrair, ao notar que se distraiu, traga interesse e amizade para essa mudança da atenção dos pensamentos para a presença, e relaxe. Lembre: a essência da meditação é consciência, e quando tem consciência da distração, já deixou de estar distraída/o. Volte assim a atenção para os sons, as sensações e até emoções e pensamentos que possam estar a acontecer no presente. Permita que a âncora permaneça em primeiro plano e note a transitoriedade da sua experiência momento a momento.
- Aprofundar a presença com duas perguntas:
- Qual a minha experiência agora? O que está a acontecer em mim agora?
Isto ajuda a direcionar a atenção para a experiência interior. Pode experimentar notar e nomear as ondas mais fortes da sua experiência, — “impaciência” “preocupação” “agitação” “contração” “sons” “julgamentos” — como uma forma de cultivar uma presença mais desperta e clara e também de não se identificar com a experiência ou os fenómenos. Pois não somos os fenómenos, mas sim a consciência que observa…
- Posso estar com o que está?
Isto vai ajudar a relacionar-se com o que quer que esteja a surgir com aceitação. Depois de nomear a experiência (irritação, preocupação, receio) pode experimentar a “meditação do sim” sussurrando interiormente “sim” a seja o que for que surja na consciência.
- Lembrar a gentileza
Se surgirem emoções difíceis ou perturbadoras, lembre de cuidar de si com gentileza e bondade. Pode fazer algum tipo de gesto tranquilizador, como colocar a mão ou as duas mãos no peito ou noutra zona do corpo que considere reconfortante. Jon Kabat-Zin dizia que em vez de Mindfulness poderíamos dizer Heartfulness pois são inseparáveis: e quanto mais trouxermos essas qualidades para a nossa prática, para a relação que estabelecemos connosco e com a nossa experiência, mais rica e carinhosa é a relação que estabelecemos connosco e com o mundo à nossa volta.
- Tudo é uma questão de perceção
“Tudo está estreitamente ligado à perspetiva que escolhemos adotar. Com um estado de espírito positivo, podemos transformar todas as atividades. Mesmo as tarefas fastidiosas tornam-se interessantes, e as tensões interiores que elas ocasionavam antes desaparecem… No princípio, é preferível sentarmo-nos para nos habituarmos a tomar consciência da inclinação da nossa mente. Quando despejamos água lamacenta num recipiente, é preciso deixar decantar para que ela reencontre a sua limpidez. Estando alguns instantes tranquilos e sem tensões, vemos melhor dentro de nós mesmos. Com tempo, essa faculdade torna-se natural. Conscientes do que se passa na mente, não nos deixamos mais ser assaltados por sentimentos negativos ou por sonhos inúteis que não se realizam nunca.
A calma irá estabelecer-se gradualmente, para tornar-se habitual, depois natural. O exame da motivação faz-se então de maneira espontânea, mesmo em plena atividade, o que é precioso se temos intenção de pisar terrenos férteis em conflitos como o trabalho e a família; aí onde outrora a mente teria sido solicitada em várias direções, será mais fácil ficar calmo e construtivo.”
Diamant de Sagesse, Tulku Pema Wangyal